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    Valter Pomar

    Historiador e integrante da Direção Nacional do PT

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    Impugnação da filiação de Marta Suplicy ao PT

    "Venho por meio desta impugnar a filiação de Marta Suplicy. Os motivos são inquestionáveis, duros de explicar e de engolir", diz Valter Pomar

    Marta Suplicy (Foto: Reprodução (YT))

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    Prezado companheiro Laércio Ribeiro, presidente do DM do PT São Paulo capital

    Prezado companheiro Kiko Celeguim, presidente do Diretório estadual do PT SP

    Prezada companheira Gleisi Hoffmann, presidenta do DN do PT

    No dia 2 de fevereiro de 2024, Marta Suplicy assinou uma ficha de filiação ao Partido dos Trabalhadores.

    Venho por meio desta impugnar a filiação de Marta Suplicy.

    Faço isso com base nos prazos e termos previstos pelo estatuto do PT.

    Sugiro que a impugnação seja debatida e votada diretamente no Diretório Nacional do PT, seja por economia processual, seja pela articulação da filiação ter sido feita nacionalmente, seja devido ao caráter nacional da disputa em São Paulo capital, seja devido à dimensão nacional da pessoa a quem se pretende filiar, seja devido ao fato de o estatuto assim o permitir.

    Minha impugnação à filiação da Marta Suplicy ao PT está baseada nos seguintes motivos:

    #

    Motivo 1

    O fato de Marta Suplicy ter deixado o PT, em 2015, fazendo pesadas acusações contra o nosso Partido, especialmente quanto ao tema “corrupção”.

    Abaixo está a íntegra da carta em que Marta Suplicy informou os motivos de sua saída do PT.

    É de conhecimento público que o Partido dos Trabalhadores tem sido o protagonista de um dos maiores escândalos de corrupção que a nação brasileira já experimentou, sendo certo que mesmo após a condenação de altos dirigentes, sobreviveram novos episódios a envolver a sua direção nacional.

    No meu sentir e na percepção de toda a nação, os princípios e o programa partidário do PT nunca foram tão renegados pela própria agremiação, de forma reiterada e persistente.

    Para mim, como filiada e mandatária popular, os crimes que estão sendo investigados e que são diária e fartamente denunciados pela imprensa constituem não apenas motivo de indignação, mas consubstanciam um grande constrangimento.

    Aqueles que, como eu, acreditam nos propósitos éticos de sua carta de princípios, consolidados em seu programa e em suas resoluções partidárias, não tem como conviver com esta situação sem que essa atitude implique uma aceitável conivência.

    Ao tentar empenhar-me numa linha de providências, fui isolada e estigmatizada pela direção do meu partido. Percebi que o Partido dos Trabalhadores não possui mais abertura nem espaço para o diálogo com suas bases e seus filiados dando mostras reiteradas de que não está interessado, ou não tem condições, de resgatar o programa para o qual foi criado, nem tampouco recompor seus princípios perdidos.

    Hoje o PT se distanciou completamente dos fundamentos que há 35 anos nos levaram a construí-lo com entusiasmo e envolvimento.

    Por décadas, acreditei e dei o melhor de mim na perseguição de ideais que, com acertos e erros, não se distanciavam de um norte ético indiscutível e intransigente.

    Hoje, entretanto, não me sinto mais em condições de cooperar com o que não faz mais sentido a mim e a milhões de brasileiros.

    A direção do Partido dos Trabalhadores vem restringindo, cerceando e limitando a atuação e desempenho de minhas atividades partidárias e, o que é mais grave, da minha atividade parlamentar oriunda da representação política de meu mandato.

    Os fechamentos de espaços são muitos, com acontecimentos e constrangimentos públicos que envolvem situações e ações que, no passado recente, chegaram ao limite de colocar em risco minha eleição como senadora pelo Estado de São Paulo nas eleições de 2010.

    É de conhecimento público que o Partido dos Trabalhadores tem sido o protagonista de um dos maiores escândalos de corrupção que a nação brasileira já experimentou, sendo certo que mesmo após a condenação de altos dirigentes, sobreviveram novos episódios a envolver a sua direção nacional.

    Vivencio o dia mais difícil e o pior momento de minha vida política. Como membro do PT, encontro-me em uma situação bastante constrangedora na bancada do plenário do Senado. Tenho me furtado a discursar e emitir minhas opiniões por me negar a defender um partido que não me representa, assim como milhões de brasileiros que nele um dia acreditaram. Situação sem sentido que não tenho mais condições de deixar perdurar.

    Serei fiel ao meu mandato e permanecerei depositária dos valores defendidos por aqueles que votaram em mim, hipotecaram sua confiança pessoal, e abraçaram as ideias que defendo desde a época em que me tornei pessoa pública em programa diário de TV onde sempre me pautei por princípios éticos inegociáveis.

    Até onde pude, tentei reverter essa situação. Não fui ouvida. Não tenho compromisso com os reiterados desvios programáticos e toda sorte de erros cometidos.

    Minha atuação como senadora não pode ser isolada. Todo parlamentar precisa de um partido e o partido se expressa por meio de seus representantes eleitos.

    Para quem é mandatária, como sou, eleita legitimamente por mais de 8 milhões de votos, resta-me a certeza de que minha prioridade é a fidelidade ao mandato que me foi outorgado pelo povo do Estado de São Paulo.

    Como o exercício de meu mandato vem sendo claramente cerceado, em seu nome e em sua defesa, como representante popular, sinto-me na responsabilidade e no dever de agir neste sentido.

    Diante do exposto, é presente a petição para REQUERER A MINHA DESFILIAÇÃO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT, a partir desta data.

    São Paulo, terça-feira, 28 de abril de 2015

    Marta Teresa Suplicy

    A carta acima está disponível nas redes sociais, por exemplo no endereço “Constrangida” por escândalos de corrupção, Marta deixa o PT (terra.com.br)

    Como se pode constatar a partir da leitura da carta acima, os motivos que Marta apresentou ao sair do PT não incluíam divergências acerca da condução do governo, a partir de 2011, nem discordâncias acerca da candidatura do Partido à presidência, em 2014. A preocupação central de Marta, em sua carta, é acusar o PT de envolvimento em casos de corrupção.

    Curiosamente, depois de sair do PT, apresentando os pretextos acima expostos, Marta se filiou ao PMDB. Abaixo está o link que permite visualizar o ato público de filiação de Marta ao PMDB, ato em que discursaram pessoas como Michel Temer e Eduardo Cunha, de conduta sabidamente exemplar no trato da corrupção.

    Senadora Marta Suplicy, ex-petista histórica, se filia ao PMDB (youtube.com)

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    Motivo 2

    Os votos que Marta proferiu, no Senado, em favor de políticas antipopulares, causando danos imensos à classe trabalhadora.

    Como exemplo, peço a leitura da publicação divulgada pelo Sindicato dos Bancários:

    Reforma Trabalhista Como Votaram os Parlamentares (spbancarios.com.br)

    Peço, também, atenção para a entrevista de Marta Suplicy, disponível no link abaixo.

    Marta: reforma trabalhista 'não é lei do Temer' e deve ser votada na CCJ — Senado Notícias

    Peço atenção, finalmente, para o discurso feito pela presidenta nacional do PT, companheira Gleisi Hoffmann, dialogando diretamente com a então senadora Marta Suplicy.

    O discurso da companheira Gleisi está disponível no link abaixo.

    Glesi Hoffmann confronta Marta Suplicy, contra a reforma trabalhista (youtube.com)

    Curiosamente, tanto no discurso supracitado quanto no ato de 2 de fevereiro de 2024, a companheira Gleisi Hoffmann faz referência aos ensinamentos proporcionados por Marta. Entretanto, como se pode constatar no vídeo acessível no link abaixo, o mesmo fato é citado com propósitos bastante diferentes.

    https://www.youtube.com/live/-1-mGkn3QBA?si=SWRtkmVpCEIpZ4wf

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    Motivo 3

    O voto que Marta deu em favor do impeachment golpista contra a presidenta Dilma Rousseff. Com aquele voto, Marta traiu parte do eleitorado que a havia colocado no Senado, traiu o partido do qual fizera parte até há pouco e que a elegera inúmeras vezes. E, principalmente, traiu o povo brasileiro, uma vez que ajudou a abrir caminho para vários anos de retrocesso econômico, político, social e cultural, que tantas vidas custaram e tanto sofrimento causou.

    A esse respeito, peço a leitura da entrevista disponível no link abaixo. Nesta entrevista, Marta faz ataques contra a presidenta Dilma Rousseff e apresenta seus motivos em favor do impeachment.

    https://youtu.be/IlU9vAvrwbc?si=FT4rnJwT2_V3NT3s

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    Motivo 4

    A posição que Marta adotou depois de sair do PT, tanto nos processos eleitorais de 2016, 2018 e 2020, quanto em sua participação no atual governo de São Paulo capital, do qual só saiu depois de convidada a ser vice na chapa encabeçada por Boulos. Seguem abaixo diversos links onde se podem ver alguns exemplos do que foi citado anteriormente.

    Marta Suplicy diz ter ficado triste com a eleição de Haddad à prefeitura | VEJA SÃO PAULO (abril.com.br)

    Marta ataca PT e Haddad em convenção do PMDB | Exame

    Marta Suplicy deixa o Solidariedade depois de declarar apoio a Bruno Covas (poder360.com.br)

    Marta Suplicy assume secretaria na gestão Covas em São Paulo – CartaExpressa – CartaCapital

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    No mérito, os quatro motivos acima citados são fatos inquestionáveis, duros de explicar e de engolir. Talvez por isso, tanto Marta Suplicy quanto as demais pessoas que falaram no ato realizado dia 2 de fevereiro de 2024, tenham preferido falar dos feitos de Marta entre 1979 e 2014, como se a partir de 2015 ela tivesse saído em viagem interestelar, regressando só agora.

    O motivo de tal atitude é explícito: o mais importante seria ganhar a eleição em São Paulo capital. E para isso seria fundamental ter Marta como vice. E para isso seria necessário filiar Marta no PT.

    Concordamos que é fundamental ganhar a eleição paulistana. E, mesmo sem achar fundamental, reconhecemos ser bastante positivo que, depois de anos contribuindo com a direita, Marta Suplicy volte agora a contribuir com a esquerda e, inclusive, apoie a candidatura Boulos em São Paulo.

    Mas, para contribuir com a candidatura Boulos, inclusive como candidata à vice-prefeita, Marta não precisaria necessariamente estar filiada ao PT. Esta suposta necessidade resulta de um desejo pessoal de Marta, certamente estimulada pelo fato de setores importantes do Partido não cobrarem, não digo uma autocrítica, mas pelo menos uma narrativa aceitável acerca do que ela fez a partir de 2015.

    A ausência de cobrança resulta, ao menos em parte, da crença segundo a qual, com Marta no PT, o PT ocuparia a vice, tanto na campanha quanto no governo. Contudo, tal crença desconsidera que, para que a vice seja realmente do PT, para que isso não seja uma mera ficção cartorial, é preciso que a pessoa que ocupe a vice pelo menos respeite o Partido.

    Se isto não acontecer, se não houver pelo menos respeito, não aquele professado em discursos, mas aquele exercido na prática, a vice não será do PT, a vice será apenas da pessoa que ocupa o cargo. Pois bem: os quatro motivos citados nesta impugnação atestam que Marta não respeitou o PT. E a atitude, adotada por amplos setores do Partido, de não cobrar de Marta pelo menos uma narrativa aceitável, contribui para que ela continue não respeitando, apesar das teatrais juras de amor.

    Marta não respeitou o PT quando saiu do Partido, nos acusando como fez na já citada carta. Ela não respeitou o eleitorado petista, nem o povo brasileiro, quando votou pelo impeachment. Ela não respeitou o PT, nem a classe trabalhadora, quando votou nas contrarreformas de Temer. Sem falar no que Marta disse e fez nas campanhas eleitorais de 2016, 2018 e 2020, notadamente contra as candidaturas petistas naquelas eleições.

    Portanto, se o objetivo é ter na chapa e no governo alguém que realmente represente o PT, se fazia indispensável que Marta apresentasse – se não uma autocrítica – pelo menos alguma versão, alguma explicação, alguma interpretação, alguma justificativa sobre sua carta de desfiliação, sobre seu voto no golpe contra Dilma, sobre seu voto nas contrarreformas de Temer, sobre seu apoio a candidaturas e governos de direita.

    Esperava-se que algo fosse dito, também, acerca do fato de Marta ter participado, até dezembro de 2023, daquele que Boulos disse ser o pior governo da história da cidade de São Paulo. Fato que muitos de nós podem tentar relativizar ou esquecer, mas que os inimigos não esquecerão.

    Obviamente, fazer autocrítica, ou pelo menos dar uma explicação, não impediria a ocorrência de novos desrespeitos. Mas aceitar que ela se refilie sem nada dizer a respeito é temerário, pois passar o pano nos malfeitos é estimular que eles voltem a ocorrer.

    Aliás, chega a ser desrespeitoso, depois de tudo o que aconteceu, sem que se faça um mínimo balanço sobre o que ocorreu desde 2015, falar em voltar ao “aconchego” do Partido.

    No ato de 2 de janeiro, a própria Marta Suplicy não disse absolutamente nada a respeito do que fez a partir de 2015. Outros discursos fugiram do assunto ou chegaram quase a atribuir as opções de Marta a erros do próprio Partido. Certamente o Partido errou muito, sendo importante lembrar que nossos principais dirigentes são, também, os principais responsáveis por aqueles erros. Mas nossos erros, por maiores que tenham sido, não são desculpa para ninguém ter apoiado o golpe e as contrarreformas de Temer. A culpa não é do PT!

    Aliás, de nada adianta dizer que a militância é nosso maior patrimônio, nossa razão de existir; e, ao mesmo tempo, receber com pompas e circunstâncias quem desrespeitou profundamente esta mesma militância.

    Aceitar a filiação de quem fez isso, argumentando que isso seria necessário para ganhar a eleição, significa na prática tratar nosso partido como se fossemos uma mera legenda, cujos procedimentos internos estão totalmente subordinados às dinâmicas eleitorais.

    Afinal, uma coisa é fazer uma aliança com inimigos de nossos inimigos; outra coisa é trazer para dentro do nosso Partido quem traiu, sem nem ao menos pedir uma explicação a respeito. Um dos resultados deste tipo de atitude será estimular futuras traições e descaminhos. O outro será contribuir para a desmoralização de uma parte da militância. A falta de memória é um desastre para a classe trabalhadora.

    Por tudo isto, impugno a filiação de Marta Suplicy e solicito ao DM, ao DR SP e ao DN que votem, reiterando minha opinião de que o assunto deveria ser remetido diretamente para o DN.

    Por fim, expresso meu desagrado com o fato de se ter misturado a discussão sobre a vice com a discussão sobre a refiliação. Essa mistura não interessa a quem de fato quer derrotar a extrema direita, não interessa à campanha, interessa apenas a quem quis aproveitar uma determinada situação para regressar ao Partido, sem sofrer questionamentos constrangedores. Muita gente, por conta desta armadilha, preferiu calar, embora discorde da refiliação e não tenha esquecido do que aconteceu. Compreendo os motivos de quem escolheu calar. Mas o que está em jogo não permite, na minha opinião, a opção de não fazer nada. Prefiro, portanto, recorrer aos direitos que o nosso estatuto ainda concede aos militantes do Partido dos Trabalhadores.

    Saudações petistas,

    Valter Pomar, 3 de fevereiro de 2024

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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